A CONSULTA



A CONSULTA
 Hoje em dia está cada vez mais difícil de se ter um atendimento na área da saúde. Resolvi que faria um plano, porém só fiz um odontológico, pois minha máquina de triturar comida já está ficando cada vez mais prejudicada.
Consegui marcar o dentista para uma data dois meses na frente, porém o consultório era do outro lado da cidade do Rio. Eu teria de atravessar praticamente todo o Rio de Janeiro. Moro em Magé e saí de lá três horas de antecedência, pois não queria perder aquela consulta de jeito nenhum.
Peguei o primeiro ônibus com destino ao centro da cidade e de lá pegaria outro para a zona sul. Assim que a condução entrou na rodovia, vi que as coisas não seriam tão fáceis. A estrada estava completamente parada, pois na noite anterior havia chovido em demasia. Como sempre preguei a paciência como virtude, relaxei. Tinha certeza que com três horas de antecedência nunca poderia chegar atrasado àquela bendita consulta.
Dormi um pouco na condução e quando acordei praticamente não tínhamos saído do lugar, porém eu acabei perdendo o meu lugar, pois uma idosa tinha acabado de entrar e ficou na minha frente. Sem graça, ofereci o lugar para a anciã. Ela se sentou com uma cara feia e nem me agradeceu, talvez achasse que era minha obrigação. Quero deixar claro que aquele acento que eu ocupava não era acento reservado para pessoas idosas.
Aceitei a minha condição e agora pude ver de pé todo o sacrifício que teria de fazer até chegar ao meu destino final.
Após uma hora de engarrafamento, estávamos ainda em Caxias. O motorista parecia um molenga, dava passagem a todos os outros carros e isso me deixava furioso. Num determinado ponto, o nosso “piloto” deixou entrar dois vendedores que imediatamente começaram a gritar pedindo desculpas por interromper a nossa viajem. O pior de tudo é que ele estava do meu lado, aquilo era irritante.
Duas horas depois, chegamos à avenida Brasil e logo podemos ver que nada mudaria, pois se via que o transito não andava para nenhum lugar. Vendedores na rua aproveitavam para vender água, biscoitos e balas. Alguns aproveitadores passavam entre os carros e se encontrassem alguma oportunidade, roubavam bolsas, cordões e tudo que fosse possível.
Comecei a me preocupar com a hora da consulta, devido o trânsito no centro da cidade também não ser dos melhores naquele horário. Felizmente nosso ônibus entrou na faixa seletiva exclusiva para ônibus. Houve uma melhora no deslocamento, mas, mesmo assim, ele não andava como devia. Faltando trinta minutos para o início da consulta, eu ainda estava no centro da cidade. Chovia muito, porém, consegui um ônibus que seguia pelo melhor caminho para a zona sul com muita facilidade.
A minha esperança era que não houvesse mais nenhum contratempo e aí sim eu chegaria no horário. Minhas unhas já estavam todas roídas, aquela ansiedade me matava, não poderia perder aquela consulta. Cheguei na zona sul com cinco minutos de atraso para o início da consulta. Ainda chovia muito, mas, mesmo assim, corri por entre os carros e por alguns quarteirões até chegar ao prédio do consultório dentário.
Cumprimentei o porteiro e não aguardei o elevador, subi pelas escadas. Cheguei na recepção sem fôlego.
- Bom dia, quero, dizer boa tarde senhor. Qual é o seu nome? Perguntou docemente a linda recepcionista do consultório.
- Bernardo Campos, disse entre as respirações ofegantes.
- Não estou encontrando o seu nome Senhor Bernardo, falou a moça com uma certa preocupação.
- Estou marcado para o meio dia, falei um pouco menos ofegante.
- O paciente deste horário, já está sendo atendido. O senhor tem certeza que está agendado para hoje, senhor Bernardo?
- Claro! Olhe só aqui na minha agenda.
- Só tem um problema senhor, hoje ainda é dia 14 e a sua consulta está marcada para o dia 15, ou seja, amanhã ao meio dia.
Eu mereço...


Francisco de Assis D. Maél
Médico & Escritor

Outras obras do autor:
Compra-se vida – Ficção religiosa
Fragmentos de uma vida – Autobiografia
Áxis a síndrome sagrada – Ficção Científica
Missionários da saúde em ação – Orientação à saúde
MANA-YAM e a árvore de amigos - Infantil
Historinhas que ninguém lê - Contos
O dia da minha morte – Romance
Num piscar de olhos – Romance
Dívidas de gratidão – Romance
Senhor X – Romance

Um comentário:

soninha disse...

Vim agradecer a visita e encontro um escritor de mão cheia, médico, colega da minha filha e do meu falecido esposo.
A idade da sua formatura não tem a menor importância, o que importa de verdade é o que você fará com o seu diploma em prol dos necessitados.
Muitos formam-se jovens e não sabem o que fazer da vida, não é mesmo?
Vá em frente sob a proteção do Senhor valorizando sempre esta maravilhosa profissão. Abraços fraternos.