A DEPRESSÃO E O FEIO
Josenildo era
o “cara”. Era filho de uma lavadeira e um servente de pedreiro. Morava num apartamento
do BNH, que estava caindo aos pedaços. No momento estava desempregado, então
vivia de biscate. Fazia de tudo um pouco: desentupia esgoto, fazia gatos na
rede elétrica, entregava água mineral, namorava mulher feia. Espera aí! Namorar
mulher feia é trabalho?
Josenildo era
muito tímido. Era tão tímido que quando ia numa festa, ficava no portão (dos
fundos). Mas ele tinha razão, pois ele era feio, muito feio. Tão feio que doía.
Dizia a mãe dele que ele teve sofrimento fetal ao nascer. Com certeza teve ao
nascer e por toda a sua vida, pois gente feia pouco tem valor, a não ser quando
tem muito dinheiro ou fama, aí a feiúra fica em segundo plano. Belo que o diga.
Zildinho, como
era chamado pelos mais íntimos, sofria com a sua aparência. Olhar no espelho
era a pior parte do seu sofrimento. Dizia que era melhor passar fome do que ser
feio.
Um dia, de tão
triste que estava Zildinho, resolveu que iria morrer. Pronto! Estava feito a
desgraça, além de feio estava depressivo. Sabe o que é pior que feio e depressivo?
É ser feio, depressivo e pobre.
Mas Josenildo
era amado, Amado dos Santos. Este era seu sobrenome.
Escolheu o
prédio mais alto do local, um sobrado do seu Miguel, mas quando viu que não era
muito alto, desistiu. Se ele pulasse daquele sobrado, quebraria a perna e a
cara. Foi então para o centro da cidade, lá encontraria arranha céus com mais
de três andares.
Foi cochilando
na viagem. Cochilando? O bicho até roncava. Quando soltou do ônibus, que veio
lá de Queimado, ficou tonto de tanta gente. Seguiu pela Presidente Vargas até
achar o prédio mais alto. Encontrou. E agora, como chegar lá em cima? Perguntou
ao homem fardado que estava na portaria:
- Seu moço,
como eu faço para pular lá de cima?
- A portaria
para suicídio é aquela da esquerda, informou o vigilante.
Zildinho não
entendeu bem a informação, mas foi ao local indicado pelo homem fardado.
- Dona moça,
como eu faço para chegar lá em cima?
- É para
pular? Entra naquela fila ali, pega uma senha e aguarde naquele corredor. Tempo
de espera de umas quatro horas.
Josenildo
entrou na primeira fila que viu, esperou quase uma hora e quando chegou a sua
vez a recepcionista olhou para ele e disse:
- Senhor, a
fila da feiúra é aquela última, apontando em direção ao final do corredor.
O bom da fila
da feiúra é que podia ficar sentado, e a cada pessoa que ia sendo chamada, se
mudava de lugar. O feio ficou do lado de uma mulher. Foi amor à primeira vista.
Ela olhou para ele, ele olhou para ela e houve algo no ar. Como ela era linda,
pensou ele. Ficou sem jeito, mas criou coragem e perguntou:
- Você está
aqui faz muito tempo?
- Não, eu
estava lhe esperando. Acabei de chegar.
- Me
esperando? Você me conhece?
- Mas claro,
eu sou a morte...
De repente
houve uma parada brusca e o trocador gritou:
- Aí Mané!
Chegamos à Central. Desembarque obrigatório.
Zildinho
acordou assustado, desceu do ônibus, entrou pela outra porta, pagou a passagem
e se sentou pensando: É melhor eu voltar pra casa... Tenho medo de altura.
Francisco de Assis D. Maél
Médico & Escritor
E mail: franciscomael@yahoo.com.br
Outras obras do autor:
Compra-se vida –
Ficção religiosa
Fragmentos de uma
vida – Autobiografia
Áxis a síndrome
sagrada – Ficção Científica
Missionários da saúde
em ação – Orientação à saúde
MANA-YAM e a árvore
de amigos - Infantil
Historinhas que
ninguém lê - Contos
O dia da minha morte
– Romance
Num piscar de olhos –
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Dívidas de gratidão –
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Senhor X – Romance
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