Era sábado, o sol estava quente,
a praia estava repleta de mulher bonita, o calçadão cheio de crianças brincando
e idosos em cadeira de rodas e eu ali.
Eu não estava na praia, estava no
supermercado. Justamente naquele dia e naquela hora minha mulher resolveu fazer
compras.
Existe alguma coisa pior do que
supermercado cheio? Existe, supermercado cheio com preços altos e velhinhos na
fila do caixa.
Minha bela e adorada esposa
seguia pelos corredores apertados do mercado e eu seguia atrás empurrando um
enorme carrinho. Acho que eles fazem carrinhos de supermercado grande para a
gente comprar o máximo possível.
Primeira parada, corredor dos
grãos. Arroz, feijão e... Cadê os preços? Justamente os produtos que a gente
quer levar estão sem preço. Procura-se uma maquininha com leitor ótico para
confirmar os preços e invariavelmente ela está quebrada.
Outro corredor. Laticínios,
depois foi o de higiene e por aí a fora.
- Francisco, entra na fila dos
frios, ordenou minha mulher.
- O que é para pedir?
- Mussarela fatiada, presunto e
azeitona.
Enquanto eu amargava na fila dos
frios, a administradora do meu lar procurava um pedaço de carne de segunda.
Claro que tem de ser de segunda, já viu o preço do contrafilé?
- Quatrocentas gramas de
presunto, gritou uma senhora na minha frente.
O mais engraçado é que
dificilmente o freguês acerta o sufixo “entos” quando se refere a
gramas. Pois é, gramas é masculino: o grama.
Chegando na minha vez, não fiz de rogado:
- Duzentas e cinquenta
gramas de mussarela.
Ninguém notou nada, já estou me
sentindo “povão”. Ah! Tem também o problema do “ss” ou “ç” da mussarela,
parece que agora pode se escrever de qualquer jeito.
- Agora vá para a fila do caixa,
determinou a patroa.
E lá vou eu com o carrinho
apinhado de compras em busca de um caixa para pagar as mercadorias. De longe já
vi que seria complicado, tinha gente com carrinho para todo lado.
Cheguei atrás de uma senhora de
cabelos brancos e perguntei:
- A senhora está em qual fila?
A pergunta fazia sentido, pois
ela se encontrava numa posição que não se sabia identificar em qual fila ela se
encontrava.
- Eu? Bem... Disse a idosa
olhando qual fila deveria escolher, o senhor quer passar?
- Não senhora, quero saber qual a
fila que a senhora está para eu decidir a minha.
- Eu ainda não sei, falou baixinho
a dona.
Desisti. Escolhi outra fila. Não
iria me arrepender, pois esta fila estava andando rápida. Pensei cedo demais,
na minha frente uma outra idosa contava o dinheiro retirado de dentro do
porta-seios.
- Não vai dar, tira este
desinfetante.
A caixa, pacientemente, fez a
correção e disse:
- Vai ter de tirar mais alguma
coisa, ainda não dá para pagar.
- Tira também o iogurte... Não,
não, meu neto vai reclamar se eu não levar o iogurte.
Meu Deus do céu, é por isso que
não quero ficar velho, pensei eu com meus botões.
- Só faltava esse, falou minha
mulher chegando com o último item das compras.
Olhei para o lado e a idosa que
não tinha se decidido por qual fila, ainda não tinha chegado ao caixa. Sorri
vitorioso.
Minha alegria durou pouco. Assim
que a senhora da minha frente conseguiu pagar a conta e deixar de levar alguns
itens, chegou o fiscal de caixa.
- Vim fazer a coleta do dinheiro,
disse o fiscal para a mulher que registrava as compras.
Alguém aí sabe o porquê das
caixas de supermercado serem mulheres? Acho que nunca vi homem como caixa.
Deixa pra lá.
Foram infinitos cinco minutos da
caixa mulher contando e conferindo o faturamento até o momento. Eu não falei
nada, mas por dentro eu me condenava. A velhinha, na fila ao lado, já tinha ido
embora e eu ainda nem tinha começado a passar as minhas compras.
Para minha esposa, parecia que
nada estava acontecendo, ela nunca se aborrecia nas filas.
Chegou a hora de pagar as
compras.
- Isso tudo? Exclamei alarmado
com o valor.
- Pois é, acho que seu salário está
ficando defasado, comentou minha esposa, é melhor você providenciar um segundo
emprego.
- Outro emprego?
- É, só assim eu vou poder dizer
para todo mundo: Meu marido Francisco tem “dois” empregos.
Valha-me Deus.
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Francisco de Assis D. Maél
Médico & Escritor
E mail: franciscomael@yahoo.com.br
Outras obras do autor:
Compra-se vida –
Ficção religiosa
Fragmentos de uma
vida – Autobiografia
Áxis a síndrome
sagrada – Ficção Científica
Missionários da saúde
em ação – Orientação à saúde
MANA-YAM e a árvore
de amigos - Infantil
Historinhas que
ninguém lê - Contos
O dia da minha morte
– Romance
Num piscar de olhos –
Romance
Dívidas de gratidão –
Romance
Senhor X – Romance
Um comentário:
Francisco, não sei se o texto é ficcional apenas, mas me pareceu bastantemente baseado em fatos reais. por esses motivos de superpopulação onde quer que se vá, que eu permaneço o maior tempo da minha existência em casa. Mesmo assim, às vezes, a casa enche. Aparece parentes de todos os lados, alguns até falando em outro idioma. Daí o quarto é o meu lugar de refúgio, mas nele, se encontram duas crianças - filhos dos meus tios - dormindo ou fazendo bagunça.
Resultado: resolvo sair de casa, sem trocar de roupa mesmo, daí encontro amigos de infância na rua, aqueles que vc não vê há décadas e ele começa a prosear coisas que nem ele entende.
Supermercados, destes grandes - "super" de fato - não entro há bastante tempo, mas lembro dos preços altos, dos preço não etiquetados, das máquinas quebradas, das filas, etc, e a única coisa que se salva são os produtos que ficavam disponíveis com aquelas mulheres iguais as das propagandas do sbt, para provar. Eu dava 5 voltas no quarterão das prateleiras só para provar e reprovar sucos, bolachas (ou biscoitos?), e ainda ouvia meu pais dizer: "na volta, eu compro".
Hoje ainda, escreverei sobre a super-população nos ônibus coletivos. Basta uma volta neles, pelo menos em minha cidade, pra você ficar perdido dentro dele mesmo.
Abraço.
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